quarta-feira, 24 de junho de 2009

PROVÉRBIO ESCONDIDO

Conta-se que uma vez se reuniram todos os Sentimentos e Qualidades dos homens, num certo lugar da Terra.
Quando o Aborrecimento já tinha resmungado, pela terceira vez, a Loucura, como sempre muito louca, propôs:
- Vamos brincar às escondidas?
A Intriga levantou a sobrancelha intrigada e a Curiosidade sem poder conter-se perguntou:
-Escondidas? Como é que se joga?
- É um jogo – explicou a Loucura – em que eu fecho os olhos e começo a contar de um a um milhão, enquanto vocês se escondem. E, quando eu tiver terminado de contar, o primeiro de vocês, que eu encontrar, ocupará meu lugar para continuar o jogo.
O Entusiasmo dançou seguido pela Euforia; a Alegria deu tantos saltos que acabou por convencer a Dúvida e até mesmo a Apatia, que nunca se interessava por nada. Mas nem todos quiseram participar: a Verdade preferiu não se esconder:
- Para quê, se no final todos me encontram? – Pensou.
A Soberba opinou que era um jogo muito tonto (no fundo o que incomodava era que a ideia não tivesse sido dela) e a Covardia preferiu não se arriscar.
- 1, 2, 3, 4 … – começou a contar a Loucura.

A primeira a esconder-se foi a Pressa, que caiu atrás da primeira pedra no caminho. A Fé subiu ao céu e a Inveja escondeu-se atrás da sombra do Triunfo que, com o seu próprio esforço, tinha conseguido subir à copa da árvore mais alta. A Generosidade quase não conseguiu esconder-se, porque cada local que encontrava parecia perfeito para algum de seus amigos: se era um lago cristalino, era ideal para a Beleza, se era a copa de uma árvore, era perfeito para a Timidez, se era uma rajada de vento, era magnífico para a Liberdade. Assim, acabou por se esconder num raio de sol.
O Egoísmo, pelo contrário, encontrou um local muito bom desde do início. Arejado, cómodo, mas só para ele.
A Mentira escondeu-se no fundo do oceano (mentira: ela escondeu-se foi atrás do arco-íris!) e a Paixão e o Desejo, no centro dos vulcões. O Esquecimento, não me recordo onde se escondeu, mas isso não é o mais importante.
Quando a Loucura já estava nos 999.999, o Amor ainda não havia encontrado um local para se esconder, pois já todos haviam sido ocupados. Finalmente, encontrou uma rosa e, carinhosamente, decidiu esconder-se entre as suas pétalas.
- Um milhão! - Terminou de contar a Loucura e começou a busca.
A primeira a aparecer foi a Pressa, apenas a três passos de uma pedra.
Depois, escutou a Fé a discutir zoologia com Deus, no céu.
Sentiu vibrar a Paixão e o Desejo nos vulcões.
Aproveitando um descuido, encontrou a Inveja e, claro, conseguiu deduzir onde estava o Triunfo.
O Egoísmo, não teve que o procurar, porque ele mesmo, sozinho, saiu do seu esconderijo, que, na verdade, era um ninho de vespas.
De tanto caminhar, sentiu sede e, ao aproximar-se de um lago, descobriu a Beleza.
A dúvida foi mais fácil ainda, pois estava sentada em cima de uma vedação, sem conseguir decidir onde havia de se esconder.
E assim foi encontrando todos: o Talento entre as ervas frescas, a Angústia numa cova escura, a Mentira atrás do arco-íris (mentira: na verdade estava no fundo do oceano!) e até o Esquecimento, que já se tinha esquecido de que estava a brincar às escondidas.
Apenas o Amor não aparecia em lado nenhum. A Loucura procurou por baixo de cada rocha do planeta, atrás de cada árvore, em cima de cada montanha e, quando estava quase a dar-se por vencida, encontrou um roseiral.
Então, pegou numa forquilha e começou a remover os ramos. Quase instantaneamente ouviu um grito de dor. Os espinhos tinham ferido o Amor nos olhos! A Loucura não sabia o que mais havia de fazer para se desculpar!... Chorou, rezou, implorou, pediu desculpas, perdão e prometeu ser guia da Loucura para todo o sempre.
Desde essa altura, desde que, pela primeira vez, se brincou às escondidas na Terra, “ O amor é cego e a loucura acompanha-o sempre.”

In http://www.pensador.info/frase/MTg3ODAz/ (texto adaptado)

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